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Antissepsia e Esterilização: A Revolução de Lister e o Caminho até os Dias Atuais

Atualizado: 12 de set.



Se preferir pode escutar o post!



Descubra como Lister revolucionou a cirurgia com a Antissepsia e Esterilização, reduzindo infecções e transformando a medicina até hoje.



história da antissepsia

Imagine entrar em um hospital no início do século XIX. A cena não lembra em nada os ambientes limpos e claros que conhecemos hoje. Médicos trajavam roupas comuns, muitas vezes os mesmos aventais usados em várias cirurgias consecutivas, manchados de sangue seco. Não havia luvas, máscaras ou álcool em gel. Instrumentos cirúrgicos, após serem usados em um paciente, eram simplesmente limpos superficialmente e reutilizados no próximo. O conceito de microrganismos invisíveis como causadores de doenças ainda era uma ideia distante da prática médica cotidiana.

Nesse cenário, a cirurgia era quase sempre o último recurso. Não pelo risco da própria operação em si, mas porque sobreviver ao procedimento não significava escapar da verdadeira ameaça: as infecções pós-operatórias. Eram comuns quadros de gangrena, septicemia e morte dias após intervenções simples. A chamada “febre de hospital” matava mais do que as próprias doenças que se tentava tratar.

Foi nesse mundo que surgiu a figura de Joseph Lister, um cirurgião britânico que mudou para sempre a história da medicina.


O contexto antes de Lister


história da antissepsia

No início do século XIX, cirurgias eram rápidas, brutais e sem anestesia. Com a descoberta do éter e do clorofórmio, por volta de 1846, tornou-se possível prolongar os procedimentos, abrindo espaço para operações mais complexas. Mas um novo problema veio à tona: quanto mais tempo se mantinha um paciente aberto, maior era o risco de infecção.

Hospitais eram vistos quase como lugares de morte certa. Pacientes temiam ser internados, pois sabiam que chances de complicações infecciosas eram altíssimas. Médicos falavam em “miasmas”, vapores ruins do ar, como responsáveis por tais infecções. A teoria microbiana ainda não era amplamente aceita, e a ideia de que mãos e instrumentos poderiam carregar inimigos invisíveis parecia absurda para muitos.

Foi nesse cenário que Lister começou a observar e questionar. Inspirado pelas descobertas de Louis Pasteur, que demonstrava que microrganismos estavam por trás da fermentação e da deterioração de alimentos, ele ousou aplicar esse conhecimento à cirurgia.


A revolução de Lister


Em 1867, Joseph Lister publicou seus primeiros resultados no jornal The Lancet. Ele descreveu o uso do ácido carbólico (fenol) para limpar feridas, esterilizar instrumentos e até desinfetar o ar ao redor do paciente. Os resultados foram impressionantes: as taxas de infecção caíram drasticamente.

história da antissepsia

Lister começou a borrifar ácido carbólico no ambiente cirúrgico, mergulhar instrumentos e até lavar as mãos com a solução. Apesar do cheiro forte e irritante, a mortalidade pós-operatória despencou. Onde antes 50% dos pacientes morriam após amputações, agora a maioria sobrevivia.

Mas a aceitação não foi imediata. Muitos colegas ridicularizavam suas ideias. Era difícil acreditar que algo invisível poderia causar tanto dano. Ainda assim, os resultados falavam por si. Pouco a pouco, a prática da antissepsia foi se espalhando, primeiro pela Inglaterra, depois pela Europa e pelo mundo.

Lister não apenas reduziu infecções — ele inaugurou uma nova era. Pela primeira vez, havia ciência organizada por trás da segurança cirúrgica.


Do ácido carbólico às técnicas modernas


Com o tempo, ficou claro que o ácido carbólico tinha efeitos colaterais importantes, como irritação da pele e toxicidade. Novas substâncias foram testadas, e o conceito de antissepsia foi se aperfeiçoando.

história da antissepsia

Logo, surgiu um passo além: a assepsia. Em vez de apenas “matar microrganismos” após o contato, a ideia passou a ser evitá-los desde o início. O foco mudou para esterilização de instrumentos antes das cirurgias, higienização rigorosa das mãos e roupas específicas para o ato cirúrgico.

A fervura de instrumentos foi substituída pelo uso de autoclaves, que utilizam vapor sob pressão para eliminar germes de forma muito mais eficaz. Aventais e campos cirúrgicos passaram a ser esterilizados. O uso de luvas, inicialmente introduzido para proteger as mãos de dermatites causadas por substâncias químicas, logo mostrou benefícios também para o paciente.


Avanços do século XX


história da antissepsia

Ao longo do século XX, a evolução da esterilização acompanhou o avanço da microbiologia. As descobertas de bactérias resistentes, a introdução dos antibióticos e o crescimento das cirurgias complexas exigiram protocolos cada vez mais sofisticados.

  • Anos 1920–30: introdução das luvas estéreis como prática padrão.

  • Anos 1940: popularização da penicilina como antibiótico adjuvante contra infecções.

  • Anos 1950–60: desenvolvimento de materiais descartáveis, como seringas e agulhas.

  • Anos 1980: protocolos universais de biossegurança, reforçados pela epidemia de HIV.

  • Anos 2000 em diante: monitoramento digital de autoclaves, rastreabilidade de materiais estéreis e reforço em protocolos hospitalares globais.

Cada inovação reforçou a ideia de que a segurança do paciente dependia tanto do conhecimento técnico quanto da disciplina em higiene e esterilização.


O impacto na mortalidade cirúrgica


história da antissepsia

Antes de Lister, amputações tinham mortalidade de até 50%. Cirurgias abdominais eram quase sempre fatais. Hoje, graças às técnicas de antissepsia, esterilização e ao uso de antibióticos, esses números despencaram. Intervenções que antes eram impensáveis, como transplantes de órgãos ou cirurgias minimamente invasivas, só são possíveis porque a barreira contra infecções foi consolidada.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que milhões de vidas são salvas anualmente graças a protocolos de esterilização e antissepsia. Mais do que uma prática, trata-se de um pilar da medicina moderna.


Do passado ao presente: o que ficou


Apesar de toda a tecnologia, o princípio que norteou Lister continua atual: microrganismos invisíveis podem matar, e preveni-los é sempre melhor do que tratá-los.

Hoje, as salas cirúrgicas são ambientes de altíssima complexidade:

  • Ar condicionado com filtros HEPA que controlam partículas.

  • Autoclaves digitais que registram temperatura e pressão de cada ciclo.

  • Campos cirúrgicos descartáveis e embalagens invioláveis de instrumentos.

  • Equipes treinadas em protocolos de paramentação e higiene de mãos.

Tudo isso para que a chance de contaminação seja a menor possível.


O futuro da antissepsia e esterilização


O futuro aponta para tecnologias ainda mais sofisticadas. Já se estuda o uso de plasma frio para esterilizar materiais sensíveis ao calor, além de sistemas robóticos que reduzem o contato humano com instrumentos. Nanotecnologia, materiais antimicrobianos e inteligência artificial para monitorar processos de esterilização também estão no horizonte.

Mas, acima de tudo, o legado de Lister continua vivo: questionar práticas estabelecidas, observar resultados e nunca subestimar os inimigos invisíveis.


Uma história que inspira confiança


Quando um paciente deita em uma mesa de cirurgia hoje, ele carrega consigo o peso de séculos de descobertas. Da ignorância dos miasmas ao conhecimento científico dos microrganismos, da fervura rudimentar ao monitoramento digital, cada etapa foi construída para aumentar as chances de sucesso.

Joseph Lister talvez não imaginasse que sua insistência em borrifar ácido carbólico inauguraria uma revolução que mudaria a medicina para sempre. Hoje, ao entrar em uma sala cirúrgica limpa, iluminada e organizada, podemos lembrar que houve um tempo em que esse cenário era apenas um sonho.

E a mensagem final é clara: a história da antissepsia não é apenas sobre ciência; é sobre humanidade, vidas salvas e confiança na medicina.


-- Fernando Salan

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